sexta-feira, 18 de junho de 2010

Saramago poeta

Retrato do poeta quando jovem

Há na memória um rio onde navegam

Os barcos da infância, em arcadas

De ramos inquietos que despregam

Sobre as águas as folhas recurvadas.



Há um bater de remos compassado

No silêncio da lisa madrugada,

Ondas brancas se afastam para o lado

Com o rumor da seda amarrotada.



Há um nascer do sol no sítio exacto,

À hora que mais conta duma vida,

Um acordar dos olhos e do tacto,

Um ansiar de sede inextinguida.



Há um retrato de água e de quebranto

Que do fundo rompeu desta memória,

E tudo quanto é rio abre no canto

Que conta do retrato a velha história.

(In OS POEMAS POSSÍVEIS, Editorial CAMINHO, Lisboa, 1981. 3ª edição)

quinta-feira, 3 de junho de 2010

Wilson Bueno

A faca corta a carne...
Por uns míseros reais vai-se  uma vida...
Mas as palavras do poeta continuam...

Amor, sim:

Porque tudo é belo

A romã, o lábio, a fala, a cisterna.

Amor de amar

A casta flor do chão

E as reentrâncias do muro,

A manhã, a lua, a tarde.

Amor, sim:

Porque a cor do antúrio

Conta uma história serena

E amar o calmo confirma

O ânimo, os deuses que riem

À sombra das árvores

Do jardim de Parmênides.

Amor, sim:

Porque, amorosa, até a nuvem,

Ainda que gasosa acolherá

Meus todos, meus plenos, teus inteiros.

Wilson Bueno -  Nasceu em Jaguapitã/PR  em 1949 e é considerado um dos mais importantes escritores contemporâneos.  Tinha livros publicados no Chile, Cuba, México, Argentina e EUA.
A obra mais conhecida de Bueno, que integra antologias nacionais e internacionais, é "Mar paraguayo", de 1992, escrito em "portunhol", uma mistura de espanhol, português e guarani, onde se conta a vida de uma sofrida mulher e "el viejo".
Pela editora Planeta ele publicou "A copista de Kafka", "Amar-te a ti nem sei se com carícias" e "Cachorros do céu". O escritor tem  entregue ainda um original, ainda inédito, chamado "Mano, a noite está velha", ainda sem data para publicação.

Escritor Wilson Bueno é encontrado morto em Curitiba

Fonte: ZERO HORA

Wilson Bueno, poeta, crítico e escritor, um dos nomes fundamentais da literatura paranaense, foi encontrado morto no início da noite de segunda-feira(31/06), em sua casa em Curitiba. De acordo a polícia, Bueno foi morto com uma facada no pescoço durante tentativa de assalto à sua residência, no bairro Santa Cândida, ainda na noite de domingo.
O escritório do autor havia sido revirado, e seu corpo foi encontrado por um amigo, alertado pela diarista que atendia a casa.
Bueno transitou, ao longo de uma carreira de quase três décadas, entre a poesia e a prosa. Seu primeiro livro, Bolero’s Bar (1986), tinha apresentação do grande nome da poesia paranaense, Paulo Leminski. A obra foi lançada originalmente pela Criar Edições e depois republicado pela editora paranaense Travessa dos Editores.
Na prosa, Bueno não se furtava a experiências radicais na forma. Seu livro Mar Paraguayo (1992), por exemplo, é narrado em uma síntese arrevezada de português, guarani e espanhol, contando a história de uma mulher pobre apaixonada por um jovem surfista.
Em 2001, seu romance Meu Tio Roseno, a Cavalo (editora 34), narrativa sobre a questão fundiária, foi finalista do Jabuti. Outro romance, Amar-te a ti nem Sei se com Carícias (Editora Planeta), foi um dos 10 finalistas do prêmio Zaffari e Bourbon da Jornada de Passo Fundo de 2005, concorrendo com José Saramago, Eduardo Agualusa e Chico Buarque. Seu livro mais recente é A Copista de Kafka (2007), também pela Planeta.
Na imprensa, Bueno foi o criador do jornal cultural Nicolau, era colaborador do Estado de São Paulo e colunista de O Estado do Paraná. Durante dois anos, manteve o blog literário Diário Vagau, cujos arquivos ainda se encontram online.