terça-feira, 20 de abril de 2010

Saudade


"No seu tempo, que não sabemos qual é, sua dor se transformará em algo mais suave chamado saudade."
Alguém me falou isso.
Mas é tão difícil...
O primeiro domingo sem ele
Não mais a preocupação em terminar o almoço cedo porque ele não gostava dessas "modernidades" de almoçar fora do horário.
Não mais convidá-lo para tomar o seu copo de vinho (única bebida apreciada).
Não mais ouvir as brincadeiras dele com as crianças (ou mesmo as rabugices que nos faziam rir).

Não mais perceber a agitação dessas mesmas crianças ao seu redor, a disputar as guloseimas que ele sempre repartia com elas.
Não mais o barulho da água da mangueira molhando as plantas de manhã.
Não mais os ganidos alegres dos cães ao perceber sua presença.
Não mais ouvi-lo a contar das dificuldades do tempo na "roça".
Não mais vê-lo a buscar os nomes de familiares, amigos e conhecidos na agenda (porque ele tinha tudo anotadinho).
Não mais...
Não mais tantas e tantas e tantas outras pequenas coisas que agora se agigantam sem ele para realizá-las...
Ficam as lembranças, a saudade, o som da voz a cantar naquele festival na empresa em que ele faturou o 3º lugar e nos sentimos orgulhosos.
Ficam as lembranças do gosto musical, das canções que cantamos juntos, quando ele me ensinava, ao som de um velho violão.
Ficam as lembranças de quando me mostrou como se rabiscavam as primeiras letrinhas.
Ficam as lembranças de quando, mesmo cansado, entusiasmava-se com as aulas do curso que fazia à noite, atravessando a cidade para estudar, montado na antiga bicicleta.
E foi nessa tal bicicleta que ele me ensinou a pedalar, rindo muito quando eu, desajeitada, subia nos barrancos.
Ficam as lembranças de suas aventuras na cozinha; na maioria, bem sucedidas.
Depois veio o tempo, ladrão de energias, a doença, ladra de esperanças...
Mas fica o exemplo de um homem lutador, trabalhador, honesto em todos os sentidos. Que não passou pela nossa vida, simplesmente, mas que fez valer sua presença e deixou marcas que nunca se dissiparão.
Alivia-me saber que ele se foi com a certeza e a tranquilidade de que cumpriu sua missão por aqui.
E como cumpriu bem.
Cida dos Santos.