Foi num dia destes de agosto: o coordenador pedagógico entrou na sala em que eu estava, um 8º ano, e brincou, dizendo aquelas frases que falam que "aluno não masca chiclete, fortalece a mandíbula; aluno não falta de aula, é solicitado em outros lugares..."
Imediatamente me lembrei do texto do Leo Cunha que dá título ao livro que eu acabara de ler: "Manual de desculpas esfarrapadas". Não pensem que faço apologia ao descompromisso com os deveres por parte dos alunos, mas me vi em várias situações bem parecidas às citadas pelo escritor. Transcrevo abaixo um trecho do texto, e com certeza, quem é professor, vai também reconhecer as situações e visualizar as caras, as caretas, os sorrisos, o revirar de olhos e tantos outros trejeitos, gestos e palavras que fazem parte da nossa rotina.
Manual de desculpas esfarrapadas
Inventar desculpas pra um para-casa atrasado é especialidade de alunos de qualquer idade. Eu, que dou aula há alguns anos, já ouvi as histórias mais cabeludas, contadas com a cara mais lavada do mundo. E, o que é pior, engoli a maioria.
Outro dia resolvi fazer uma enquete com meus colegas professores pra montar um manual com as desculpas mais esfarrapadas que já ouvimos. O leitor pode chiar e perguntar se nós, ilustríssimos professores universitários, não tínhamos nada mais útil pra fazer, mas sinto muito, aqui vai a lista.
1 - A culpa é de São Pedro.Essa é das desculpas mais tradicionais. A rua alagou e eu não consegui chegar na biblioteca. Ou eu esqueci a janela aberta e o trabalho ficou encharcado. Que pena, fessor, tava tão lindo!
2 - A culpa é dos outros.
Outra desculpa clássica. Foi o Joãozinho que tinha que ter comprado a cartolina e não comprou, fessor! Foi a Joana que não fez a parte dela a tempo.
3 - A culpa é do computador.
Quem nunca ouviu essa frase, vai ouvir logo. O computador deu pau, a impressora ficou sem tinta, o disquete não abriu, um vírus apagou tudo. Você sabe que computador é um bicho imprevisível né, fessor? Temperamental feito ele só!
4 - A culpa é do excesso de trabalhos.
Essa costuma irritar meus companheiros docentes. Não é por nada não, fessor, mas o senhor acha que a gente só tem a sua matéria? Tava assim de trabalho pra fazer, os outros eram mais urgentes.
5 - Eu não sabia que era pra hoje.
Uai, mas ninguém avisou que era pra hoje! Eu tava crente que era só pra semana que vem. Ô, fessor, você é tão legal, dá mais um prazinho pra eu poder terminar, o trabalho já tá bem adiantado, só falta digitar, só falta revisar, só falta grampear, só falta fazer capa
6 - Eu não entendi direito o que era pra fazer.
Essa é das mais descaradas, e geralmente vem acompanhada de uns dois parágrafos ilegíveis. Tá vendo, fessor, eu até comecei a fazer, mas não entendi o que o senhor tava querendo. Será que dava pra explicar de novo.
7 - Minha avó morreu.
Com todas as variantes possíveis. Afinal, avó são só duas, avô também. Pai, mãe e irmão é mais arriscado, porque fica fácil pro professor conferir se é verdade ou não. Se preciso, pode apelar para um tio distante ( mas que morou com a gente muito tempo, fessor...) ou pro gatinho siamês que era quase da família ( até dormia na minha cama, precisa ver que gracinha)
8 - O supercolírio.
Desculpa a ser usada apenas em casos extremos, quando as outras realmente não colam mais. Sabe o que é, fessor? Eu fui ao oculista, pinguei um colírio daqueles brabos e fiquei seis dias com a vista embaçada. Não teve jeito mesmo de fazer o trabalho, e bem que eu tentei, mas estava tão cego que acabei escrevendo em cima da receita do médico.
A lista poderia continuar por muitas linhas, mas essas aí são as mais comuns. E, pra falar a verdade, de vez em quando a gente até se diverte vendo a aflição do aluno, admirando sua coragem, na hora de inventar as desculpas mais caraduras do mundo. Afinal de contas, sabemos que eles ainda estão aprendendo, não têm plena noção de suas responsabilidades, não são casos perdidos.
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